Então, doutora, quando o sexo vai bem, nem falamos sobre isso. Quando não vai bem, falamos […]
01/12/2023
Então, doutora, quando o sexo vai bem, nem falamos sobre isso. Quando não vai bem, falamos menos ainda!
É um erro pensarmos que é possível fingir que está tudo bem, que podemos levar o desconforto, às vezes a dor, a culpa, a ausência de desejo, de prazer, indefinidamente sem repercussões para nossa saúde física e mental.
A identificação e a nomeação do que ocorre é o primeiro passo. ” Não tenho desejo” ou ” sinto dor” já norteiam a investigação. Se existe uma parceria envolvida, toque no assunto, de preferência num local neutro, com tempo e privacidade para conversar. Digo para minhas pacientes que não se discute a relação onde se TEM a relação ou no momento que esse encontro não aconteceu e gerou mágoa, raiva, frustração. Busque o diálogo. Recebo muitas pacientes angustiadas, receosas de abordar esse tema e serem mal compreendidas. Procure falar de forma clara, direta, para não haver necessidade de interpretação ou adivinhação. ” Nossa, doutora, será que ele não percebe que eu estou distante,ou que eu não estou gostando ??” Não!! Muitas vezes seu parceiro não percebe mesmo, você precisa falar. ” E se ele achar que não gosto mais dele, que tenho outra pessoa em minha vida?” Para evitar qualquer mal entendido, assertividade é fundamental. Estima-se que entre 20 e 50 % das mulheres americanas apresentam alguma disfunção sexual ao longo da vida. No Brasil, o Estudo da Vida Sexual do Brasileiro, conduzido pela Dra Carmita Abdo, mostrou 28,5% das mulheres com alguma queixa relacionada à vivência da sexualidade.
E o que pode ser feito para tratar uma disfunção sexual? Quem trata?
O sucesso do tratamento depende de se fazer o diagnóstico da melhor forma possível. O ideal é o atendimento ser realizado por uma equipe multiprofissional, já que as disfunções tendem a ser multifatoriais,
Na maioria das vezes,o ginecologista é quem primeiro a paciente procura.Muito importante o profissional acolher a queixa , ouvir sem julgamentos, explicitar os sintomas. Há quanto tempo isso ocorre? Em que situações? Como você se sente a esse respeito? Procuramos identificar qual ou quais fases da resposta sexual estão afetadas para efeito de direcionamento do raciocínio. Assim, podemos tentar enquadrar a queixa como disfunção do desejo, da excitação, do orgasmo ou dor .
O médico muitas vezes irá diagnosticar e tratar as alterações físicas que estejam presentes. Por exemplo, processos infecciosos ou inflamatórios na vagina se traduzem em dor e dificuldade à penetração e podem ser resolvidos de forma relativamente simples. Cremes vaginais , tratamento da atrofia genital com hormônios ou laser ou reabilitação do assoalho pélvico podem garantir a saúde sexual da paciente. A fisioterapia é de grande ajuda principalmente nos casos em que a tensão da musculatura do períneo prejudica a atividade sexual.
Exames laboratoriais e de imagem também são importantes para descartar situações específicas, como mal funcionamento da tireoide ou falta dos hormônios sexuais, como acontece na menopausa. Alguns medicamentos ,como anticoncepcionais e drogas de ação central podem interferir principalmente no desejo e sua substituição pode ser interessante.
Muitas vezes não encontramos uma causa física para justificar a queixa e a avaliação por um psicólogo ou psiquiatra é necessária.
Existem vários recursos em terapia que podem ser usados dependendo do caso e, principalmente, da experiência do terapeuta. A terapia pode ser individual, em casal ou em grupo, dependendo da situação. Em especial a terapia cognitivo comportamental tem resultados muito bons , inclusive para o vaginismo e disfunção orgásmica, ajudando a ” reprogramação” da resposta sexual”. Melhorar o conhecimento sobre seu corpo e perceber como e onde você gosta de ser tocada é um bom início. A masturbação, seja sozinha ou com sua parceria, é um exercício importante para esse autoconhecimento. Algumas técnicas de relaxamento e de manutenção do foco, como no Mindfullness, também são interessantes.
Pensar em sexo, fantasiar mais, aumentar o seu repertório através de leituras e filmes também fazem parte desse processo. Avalie como vocês têm esse encontro sexual . Será que o estímulo é adequado? E a frequência desses encontros? O local, o tempo , a disponibilidade , a intimidade. O que eu PODERIA mudar? O que eu GOSTARIA de mudar?
Alguns medicamentos podem ajudar no desejo e na excitação, como o Tribulus terrestris , que é um fitoterápico, a bupropiona, que é um antidepressivo, a tibolona e os próprios hormônios masculinos.
Se você estiver na menopausa, converse com seu médico sobre reposição hormonal baseada em estradiol e progesterona. A reposição de testosterona ainda não é consenso e, quando realizada, deve ser acompanhada atentamente e por períodos limitados.
Este assunto é amplo e não se esgota em alguns artigos. Espero ter contribuído!! Pensar as próprias experiências, perceber como a vivência da sexualidade impacta sua qualidade de vida e , sempre que necessário, não ter preconceito e procurar ajuda.
Sobre a autora
Luciene Miranda Barduco, médica formada pela USP, continua apaixonada por sua especialidade, a ginecologia e obstetrícia. Depois descobriu a mastologia e, recentemente, a sexologia. Médica, esposa, mãe da Mariana e gosta muito de tudo isso!
lulubarduco@gmail.com